sábado, 4 de abril de 2009

AUGUSTO CABRITA A MEMÓRIA DAS IMAGENS

Dezasseis anos se cumpriram no passado dia 1 de Fevereiro, desde o desaparecimento físico do Augusto Cabrita. Dezasseis anos de saudades do Amigo, do companheiro das «aventuras», da arte de «viver o dia-a-dia», do Mestre fotógrafo, cineasta, do Artista, ímpar entre os demais. Augusto António do Carmo Cabrita, era oriundo de famílias algarvias, de Silves. Casado com uma senhora de Portimão, nasceu no Barreiro em 1923, terra de tradições operárias e de grande movimento associativo e artístico. Dessa terra, ao longo dos anos, saíram nomes que se tornaram cimeiros no panorama cultural português, nas mais diversas áreas. O Augusto viria a ser um deles. Desde muito jovem que se dedicou à fotografia, tendo por tal facto, a partir de 1949, recebido os mais diversos galardões nacionais e estrangeiros. Dos mais importantes são de destacar, o Prémio da Crítica, em 1962, o Prémio Nacional de Cinema, em 1964, com o filme Belarmino, os mesmos Prémios em 1970 e 1971, e o Troféu Foca de Ouro, em São Paulo-Brasil, em 1968, entre outros. Desde o início da televisão em Portugal, em 1957, que com ela começou a colaborar, tendo realizado centenas de trabalhos, como as reportagens da guerra em Angola, na Índia, do terramoto de Agadir e por aí fora. De entre os seus trabalhos mais recentes, aquele que ainda se mantém na retina de muitos espectadores, foi a série de filmes com o título genérico de Melomanias, em conjunto com João de Freitas Branco e Filipe Branco. Filmes a preto e branco em que as imagens “dançavam” ao som da música. Imagens de uma beleza impressionista, só possíveis de captar por quem ama a vida para além do que se vê, por quem domina a câmara de forma magistral. Aliás, para o Augusto a vida era uma sucessão musical de imagens e escalas, de tons e sons que “agarrava”, que sabia “agarrar” como ninguém através das suas câmaras, em filme ou foto. Aqui, convém recordar, porque muitos o não sabem: o Augusto Cabrita era um brilhante pianista. Se não tem sido fotógrafo e cineasta, o seu nome teria visto as luzes da ribalta através do piano. Mesmo após ter regressado a casa depois de uma longa e dolorosa doença que o prostrou hospitalizado por longos tempos num leito do Hospital da C.U.F., doença de que saiu sem audição, o Augusto no seu piano de cauda tocava magistralmente, como se o ouvido apurado tivesse. Com sentimento, com amor, quase sempre afinado. Ainda hoje recordo essas imagens com profunda saudade e muita nostalgia, espantado, todos os dias, com um Tejo sempre novo, largo como um mar, em pano de fundo para além das janelas da sua sala que se harmonizava com ele, connosco, com os amigos, com a Manuela, sua mulher, seu porto de abrigo. Da imagem de filmes da sua autoria são de salientar: Belarmino, de Fernando Lopes, Ilhas Encantadas, de Carlos Vilardebó, protagonizado por Amália Rodrigues e Catembe, de Faria de Almeida. Realizou os filmes, Os Caminhos do Sol, com Carlos Vilardebó, Na Corrente, com música de Carlos Paredes, A Catedral da Angústia, com música de António Vitorino de Almeida e por aí fora. Sobre o pugilista Belarmino, escreveu Augusto Cabrita: “A luz que o rosto de Belarmino irradiava era de uma beleza rara e comovente. Nascia assim tão natural, como nascem as coisas simples…Não era necessário dramatizar aquele rosto a golpes violentos de projector, porque o rosto de Belarmino era já dramático em si mesmo (…) Estou a vê-lo calmo e sereno no tapete do seu último combate (…) Guardo o plano na memória (…) É este o último plano de Belarmino.” Porém, para além das centenas de exposições fotográficas em que participou ao longo dos anos, produziu milhares de trabalhos de fotografia, com destaque para os que produziu no Oriente. De referir também os trabalhos realizados para álbuns e enciclopédias de prestigiadas editoras {que de resto continuam a saír em sucessivas edições}, como Vilas e Aldeias de Portugal, Os Mais Belos Castelos de Portugal, Os Mais Belos Rios de Portugal, Os Parques e Reservas Naturais de Portugal, A Cozinha Tradicional Portuguesa, este, em conjunto com o fotógrafo António Homem Cardoso e, Europália vista por Augusto Cabrita, (1991), com texto de Nuno Judice, entre outros. Culto, de uma rara sensibilidade e princípios éticos, reflectiam-se esses seus dotes na maneira de estar e de ser com todos, com o seu semelhante, na sua arte, na forma de captar a vida {que amava profundamente} em imagens através das suas objectivas. Dizia-me amiúde o Augusto: «Fotografar é a arte do olhar». Mestre Augusto Cabrita era um homem generoso, de carácter, nobre e leal como só pode ser um Homem Vertical. Portimão, Abril de 2009 Pedro Manuel Pereira

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