quinta-feira, 19 de abril de 2012

OS BACORINHOS LUSTROSOS


(CRÓNICA DO PAIS QUE NÃO EXISTE III)

A hipocrisia anda de mãos dadas com a ganância, a selvajaria, a mentira, numa cavalgada desenfreada, que não conhece nada nem ninguém, salvo a quem lhes seja útil para montar, para servir os seus sórdidos e sabujos objetivos.
É evidente que os seus protagonistas têm rosto, são conhecidos de todos. Servem-se do aparelho do Estado, desde o governo às autarquias e às juntas de freguesia, passando pelas sinistras empresas públicas, mais as famigeradas empresas municipais, como se propriedades suas fossem, usando-as e servindo-se do património, dos dinheiros públicos e dos trabalhadores destas, sem respeito nem pudor, como bestas que são.
A comissão liquidatária da nação, essa, ao contrário do que gente de boa-fé crê, não desconhece esta realidade, porque ao invés de ser a solução, é parte constituinte do problema, tanto mais, que numa espetacular dança de cadeiras, tem vindo a substituir anteriores clientelas políticas enquistadas nos organismos públicos, por gentalha famélica - onde os lugares não são elegíveis – da sua família de interesses, composta por harpias, vampiros, sevandijas que se vão cevando nos bolsos dos cidadãos, nos cofres dos dinheiros públicos, até que ambos fiquem de todo exauridos, enquanto eles, terão engordado e quedado lustrosos e redondinhos, como bacorinhos - eles e elas – com o dinheiro surripiado a bom recato, em contas offshore e quejandos paraísos que fariam corar de vergonha – caso fossem vivos – os mais famosos corsários das estórias da História.
Pergunta-se: - Até quando os donos dos bacorinhos os vão deixar andar à solta?


Pedro Manuel Pereira

domingo, 8 de abril de 2012

O MÁRTIR DA PRAÇA SYNTAGMA

A desoras, por haver noites que não dormem, como mais esta que por ela passamos com a retina na memória do mártir da Praça Syntagma, Dimitris Christoulas, que ao disparar sobre si, imolando-se na pátria dos deuses do Olimpo, deu um tiro, também, na consciência de todos os Homens Livres, Honestos, Honrados e Impolutos, enxovalhados, emporcalhados e açoitados, pelas bestas, pelos grunhos, pelos sevandijas que nos conduzem à miséria material, nos conspurcam a alma e tentam vergar-nos a cerviz. Têm nome: - São os eufemisticamente denominados governantes de países comunitários como Portugal, Espanha, Grécia, Irlanda, Alemanha…, que eles, mais não são que lacaios rastejantes e sabujos, como é timbre dos vermes, servis – e ao serviço - da canalha da grande finança e de sinistras corporações multinacionais.
Contam-se por centenas os que semanalmente em Portugal se suicidam pelas mesmas razões. E por eles e com eles presentes na memória, esperamos, em breve, porque a impunidade não pode reinar eternamente e ainda acalentamos a esperança - coisas da educação judaico-cristã - que haja em breve uma Revolução neste país, para ajustarmos contas com os malfeitores que conduziram e continuam a conduzir a maioria do povo português para a miséria absoluta.
Apetece-nos gritar de revolta a plenos pulmões: PUTA QUE OS PARIU!...


Pedro Manuel Pereira

sábado, 7 de abril de 2012

MORRER DE PÉ NA PRAÇA SYNTAGMA

Quando se ouviu um tiro na Praça Syntagma,
logo houve quem dissesse: “É a polícia que ataca !”.
Mas não, Dimitris Christoulas trazia consigo a arma,
a carta de despedida, a dor sem nome, a bravura,
e vinha só, sem medo, ele que já vivera os tempos
de silêncio e chumbo do terror dos coronéis.
Mas nessa altura era jovem e tinha esperança.
Agora tudo isso findara, mas não a dignidade,
que essa, por não ter preço, não se rende nem desiste.

Dimitris Christoulas podia ser apenas um pai cansado,
um avô sem alento para sorrir, um irmão mais velho,
um vizinho tão cansado de sofrer. Mas era muito mais
do que isso. Era a personagem que faltava
a esta tragédia grega que nem Sófocles ou Édipo
se lembraram de escrever, por ser muito mais próxima
da vida do que da imaginação de quem efabula.
Ouviu-se o tiro, seco e certeiro, e tudo terminou ali
para começar logo no instante seguinte sob a forma
de revolta que não encontra nas bocas
as palavras certas para conquistar a rua.
Quando assim acontece, o silêncio derruba muralhas.
Aos jovens, que podiam ser seus filhos e netos,
o mártir da Praça Syntagma pediu apenas
para não se renderem, para não se limitarem
a ser unidades estatísticas na humilhação de uma pátria. Não lhes pediu para imitarem o seu gesto,
mas sim que evitassem a sua trágica repetição.
E eles ouviram-no e choraram por ele, e com ele,
sabendo-o já a salvo da humilhação
de deambular pelas lixeiras para não morrer de fome.

Até os deuses, na sua olímpica distância,
se perfilaram de assombro ante a coragem deste gesto.
Até os deuses sentiram desprezo, maior do que é costume, pela ignomínia de quem se vende
para tornar ainda maior a riqueza de quem manda.
A Dimitris bastou um só disparo, limpo e breve,
para resumir a fogo toda a razão que lhe ia na alma. Estava livre. Tornara-se herói de tragédia
enquanto a Primavera namorava a bela Atenas,
deusa tantas vezes idolatrada e venerada.
Assim se despedia um homem de bem,
com a coragem moral de quem o destino não vence.

Quando o tiro ecoou na praça de todas as revoltas,
Dimitris Christoulas deixou voar uma pomba,
uma borboleta, uma gaivota triste do Pireu
e disse, com um aceno: “Eu continuo aqui,
de pé firme, porque nada tem a força de um homem
quando chega a hora de mostrar que tem razão”.
Depois vieram nuvens, flores e lágrimas,
súplicas, gritos e preces, e o mártir da Syntagma,
tão terreno e finito como qualquer homem com fome,
ergueu-se nos ares e abraçou a multidão com ternura.


José Jorge Letria

6 de Abril de 2012