domingo, 1 de março de 2009
DA CRISE
Portugal está cada vez mais um país de nuvens negras salpicado por um céu azul. Apesar deste Inverno ter sido rigoroso, com dias consecutivos de neblina e grande pluviosidade, o céu emergiu de quando em vez em azul tímido, pálido e envergonhado sem a luminosidade do Sul. É da crise.
Diz-se e rediz-se que a confiança dos portugueses atingiu o ponto mais baixo dos últimos anos. A maioria das famílias vê com apreensão senão já o presente, o futuro ameaçado pela falta de recursos. As dificuldades financeiras amordaçam o sorriso e moldam a inevitabilidade da miséria. É da crise .
Os bancos esconderam os ainda recentes lucros inimagináveis e num ápice apresentam rupturas de triliões (cifras quase impronunciáveis) às quais céleres e prestativos os governantes acorrem com paliativos oportunos que os portugueses irão pagar. É da crise.
As multinacionais, empresas semeadoras de muito emprego barato, reduzem os postos de trabalho, despedem, encurtam o horário de laboração, impõem o ”lay off” e fecham portas “na calada da noite”. É da crise.
Os quadros, os trabalhadores anónimos, os casais que labutam na mesma fábrica, o homem ou a mulher que carrega horas de trabalho ininterrupto na intempérie do campo, no calor abrasador da caldeira, na agrura da rua que chegam ao fim do mês sem salário, com contratos falsos, assediados por mil venenos e que se obrigam a voltar na esperança de reaver o que lhes foi sonegado. É da crise.
Os pobres que “reempobrecem”, os mendigos que mendigam, os sem-abrigo que enchem as ruas e aumentam todos os dias, a nova míngua escondida no vão de escada que mal sobrevive com o rendimento social. É da crise.
A palavra proibida que se cala, o medo da delação que persegue, o grito que se prende perante o assédio, a vénia da imposição que se aceita, o pavor dos dias incertos que se propaga. É da crise.
Os segredos que se escondem nos rostos risonhos dos governantes que levam os deputados a sancionar em Assembleia Parlamentar medidas tão contrárias aos anseios dos seus eleitores. É da crise.
E os congressos dos Partidos Políticos com gigantesca promoção mediática que prometem definições de linhas programáticas fortemente apostadas na defesa do bem comum e da democracia partilhada, mas que jamais são promulgadas. É da crise.
Será que o devir deste país que se enferma endémica e sistematicamente é o anátema da crise?
MJVS
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