terça-feira, 31 de março de 2009

A CRISE – Que perspectivas para a ultrapassarmos?

As causas da crise actual que está a afectar todo o Mundo, de Oriente a Ocidente, resultaram, em larga medida, da especulação e da ganância de gestores que, sabendo que receberiam prémios chorudos (direi mesmo obscenos) criaram esquemas muito complexos para remunerar os depósitos efectuados nos Bancos ou aplicados em fundos de investimento que, por sua vez, foram causa de duas grandes bolhas nos Estados Unidos: a imobiliária e a financeira. (1) Desde há um século e meio que reputados economistas vêm estudando os ciclos económicos, conceito que se pode definir como “alternância irregular entre recessões (2) e expansões. Isto é, as crises são cíclicas e cada uma tem especificidades próprias, porque as respectivas causas variam, de época para época e de região para região. As soluções encontradas num dado momento para uma situação específica não se mostram eficazes noutros países e noutras épocas. Quando os economistas descobrem o remédio para a saída da crise instalada, ou para colmatar os seus efeitos – após aplicação sucessiva das ferramentas possíveis (3) – já esta causou imensos estragos. A grande depressão dos finais dos anos vinte do século passado, só acabou após a II Guerra Mundial, tendo então sido aplicadas as políticas propostas por Keynes, que, em traços gerais, se definem como a necessidade de os governos enveredarem pelo investimento público como forma de gerar emprego e, em consequência, estimular o aumento da procura e do consumo. Os economistas da direita à esquerda sustentam que nos anos trinta do século passado verificou-se um colapso da procura efectiva e que, nos Estados Unidos, a Reserva Federal deveria ter enfrentado a crise com a injecção de liquidez na economia. Na realidade essa é uma das medidas preconizadas para combater as crises económicas, facilitando-se a concessão de empréstimos por parte dos Bancos, embora haja outras (4). Aliás, a crise a que agora estamos a assistir já teria sido resolvida se essa fosse a solução ! Pese embora que essa medida possa conduzir ao pleno emprego, em contrapartida, gera inflação e quando tal acontece só se pode controlar através de um período de desemprego alargado, provocando, por exemplo, o aumento súbito dos preços de alguns bens, de que cabe destacar o Petróleo, face à enorme influência que desempenha perante os preços de outros bens. Nos anos setenta houve duas grandes crises energéticas (1973 e 1979), a seguir assistimos ao advento da tecnologia, com a supressão da força de trabalho em muitos sectores, ao surgimento da globalização (5), à deslocalização de fábricas, à extrema mobilidade do capital, à supressão de medidas proteccionistas, designadamente a descida de barreiras aduaneiras, à melhoria das telecomunicações, ao advento do transporte aéreo a baixo custo e a recessões em vários países, que foram sendo ultrapassadas de acordo com soluções encontradas para cada caso. (6) À semelhança do que aconteceu em 1929/1933, quando o pânico se instala, ger-se a desconfiança e a contracção do consumo. Portanto havendo produção em excesso, não escoada, surge o drama do desemprego, porque deixando de haver encomendas, a produção tem de parar e as fábricas vêem-se obrigadas a encerrar. Ao mesmo tempo, se se registar uma corrida aos Bancos por parte dos depositantes para levantarem os seus depósitos e aqueles não dispuserem de activos suficientes para conceder os créditos de que os empresário/empreendedores necessitam para fazer novos investimentos, a economia forçosamente estagna. Acabamos por estar perante um círculo vicioso de colapso financeiro e económico. Segundo Paul Krugman a quebra do valor dos activos pode levar bancos antes sólidos à falência. Recessão económica, elevadas taxas de juro e desvalorização da taxa de câmbio podem causar a falência de empresas sólidas. Na pior das hipóteses, as perturbações económicas podem provocar instabilidade política. No séc. XX coexistiram dois sistemas económicos: o capitalismo e o “dito” socialismo, que começou a decair em 1989, com o início da queda do regime soviético, tendo colapsado de vez em 1991. A própria China com Deng Xiaoping, em 1978, abandonou o pensamento marxista e foi-se lançando paulatinamente na via do capitalismo. Na última década do séc. XX o sistema capitalista ficou com o campo livre para se expandir ainda mais, sem qualquer espécie de obstáculos e os governantes de muitos países incentivam o compadrio, a corrupção e as economias paralelas, que funcionam sem os controlos a que os Bancos e as Instituições financeiras estão normalmente sujeitos. Esses esquemas paralelos (o chamado sistema bancário-sombra, que criou e gere fundos de investimento que funcionam em pirâmide) atingem dimensões tais que escapam a quem tem o poder de controlar os mercados. Em conclusão, a actual crise teve como causas conhecidas todas as que se verificaram entre 1929 e 2008, com particular incidência na América Latina e no Sudeste Asiático, e a solução para a ultrapassar ainda não foi encontrada, porque as todas as medidas que estão a ser tomadas nos vários países, em conjugação de esforços, ainda não se mostraram eficazes para produzir efeitos e iniciar a recuperação que todos almejamos. NOTAS: (1) “Subprime”: Foram concedidos empréstimos para compra de imóveis sem se apurar quem a eles recorreu poderia suportar os encargos inerentes, no pressuposto de que sendo normal a valorização dos imóveis – cada vez mais inflacionados - caso se verificasse a falta de pagamento, o imóvel poderia ser vendido por um preço superior e, portanto, o empréstimo concedido seria reembolsado na totalidade. O problema surgiu quando os empréstimos deixaram de ser pagos e os preços dos imóveis baixaram consideravelmente, por excesso de oferta. “Mercado de futuros”: Designação dada aos fundos de investimento de alta rendibilidade, mas também de alto risco. Quando os “investidores” desses fundos quiseram receber o capital investido, não havia liquidez suficiente para lhes pagar, porque os preços dos títulos que os compunham baixaram drasticamente. (2) Excesso de oferta em relação à procura ( 3) As várias ferramentas utilizadas e os seus efeitos: - - Quando a moeda desvaloriza (por alteração das taxas de câmbio) as exportações tornam-se mais competitivas e podem crescer; - Quando as taxas de juro diminuem é natural que cresça o investimento, porque não compensa a quem detém capital deixá-lo em depósito nos Bancos, já que a remuneração é baixa; - Quando se injecta liquidez na economia através dos bancos (aumentando o acesso ao crédito) aumenta o consumo e a inflação; - Se se quiser controlar a inflação, para que a economia abrande tomam-se medidas que vão causar desemprego, que consistem em subir as taxas de juro, diminuir os gastos públicos e aumentar os impostos (Soluções estas impostas pelo FMI ao Brasil, em 1998); - A captação de capital por parte dos Bancos pode ser feita com a oferta aos depositantes de taxas de juro aliciantes (Veja-se o caso do BPN, em Portugal); - Os Governos, por sua vez, recorrem à emissão de obrigações, quando precisam de captar fundos para investimentos públicos. (4) A injecção de liquidez nos Bancos é uma das ferramentas utilizadas em certas situações, mas não é a única. Cito, nomeadamente, o aumento ou redução das taxas de juro, o investimento público segundo a posição sustentada por Keynes, a desvalorização da moeda, aumento ou redução de impostos, aumento das exportações, controlo da inflação. (5) Transferência de tecnologia e de capital de países com salários altos para países com salários baixos e o crescimento resultante das exportações trabalho-intensivas do Terceiro Mundo. (6) Exs: América Latina, destacando-se o México e a Argentina nos anos 80, em que as recuperações só foram possíveis com o apoio dos Estados Unidos, que injectaram 50 e de 12 mil milhões de dólares, respectivamente. Nos anos 90 a crise surgiu nos países asiáticos, em especial no Japão, Malásia, Indonésia, Coreia e Tailândia. O Japão enveredou por programas que permitiram a criação directa de emprego e impulsionaram a economia em geral, como a construção de estradas e pontes; mais tarde, quando o PIB começou a crescer, o desemprego diminuiu e a deflação baixou, a principal aposta para a saída da crise foi o aumento das exportações de componentes fabricados, essencialmente para a China e Estados Unidos. FONTES CONSULTADAS: - Rudolf Hilferding – “O Capital Financeiro” (trad. Espanhola) - Caludio Napoleoni – “A Teoria Económica no séc. XX” - Paul Krugman (prémio Nobel da Economia em 2008), “O Regresso da Economia da Depressão e a Crise Actual” A.M.B.S.

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