segunda-feira, 5 de novembro de 2012

OS COVEIROS DA DEMOCRACIA



                                                                                                                    Por Pedro Manuel Pereira

Encontra-se em curso de modo acelerado, uma mudança – quase – radical nas estruturas, funções sociais, económicas e políticas do Estado, que vão conduzir o país a breve prazo para uma ditadura sem suporte ideológico, porém, muito para além de qualquer ideologia conhecida de extrema-direita até hoje posta em prática em qualquer parte do mundo.
Em parte devido aos mercados, a quem caninamente obedece este governo – como outros – na EU e não só, devido à selvajaria capitalista instalada e à globalização económica.
Para tal desiderato, encontram-se em marcha alterações à Constituição da República, «pormenor de somenos importância» para os partidos do centrão, quer os que compõem o atual governo, quer o do principal partido da oposição, que em dois governos de desgoverno, conseguiu a proeza de atirar o país para um buraco negro, culminando com o negócio ruinoso do ilusório resgate da dívida pública pela tripeça composta pela Comissão Europeia, Fundo Monetário Internacional e Banco Central Europeu, a quem escancarou as portas da Nação.
Que não restem dúvidas a ninguém, que a revisão constitucional encontra-se a ser cozinhada de acordo com as diretrizes de sinistras corporações internacionais, cujo rosto visível negoceia neste momento com o governo português, acoitado no famigerado bando denominado de troika, importado pelo ex-1º ministro Sócrates – como acima referido - sem dar cavaco ao povo, salvo seja o Cavaco!
Paralelamente, esta gentalha, mancomunada com o governo(?) continua a apertar o garrote no pescoço dos portugueses. Faz parte do plano: conduzir o povo para patamares mínimos de miséria, para dessa forma melhor o poder controlar, aproveitando o facto do governo(?) – que se refundiu recentemente com a inclusão de novos secretários de Estado inodoros, assépticos e incolores – estar a gerir os negócios da governação(?) em regime de ditadura sui generis, apoiado pelo presidente Cavaco.
Recordemo-nos que ao longo deste ano Portugal tem estado em – quase – estado de sítio, com a Constituição suspensa, justificação dada no acórdão do tribunal que a tutela, que considerou ter de haver um regime de exceção à mesma por blá, blá, blá, blá, patati, patatá este ano, face à ilegalidade do governo em ter surripiado os subsídios dos funcionários públicos, pelo que, a Constituição só voltará a vigorar conforme o seu texto, a partir de janeiro do próximo ano. Tribunal dixit.
Ou seja, até 2013 o país vai vivendo sem Constituição (corpo legislativo fundamental da Nação) e o povo sem os seus direitos constitucionais salvaguardados, propiciando desta forma que o governo(?) refundido, cometa sobre o povo, sobre a Nação, os desmandos que melhor lhe aprouver, como vem acontecendo.
Saliente-se que Siza Vieira, o arquiteto português mais premiado e internacionalmente prestigiado, afirmou recentemente - na senda de outras personalidades - que em Portugal se «vive de novo em ditadura», numa expressão clara da prática governativa e do sentir da maioria dos portugueses, sobretudo os que viveram nas décadas salazarentas.
Entrementes, de acordo com os resultados de um inquérito realizado pelo Instituto Superior de Ciências Sociais apresentados em Lisboa, a satisfação dos portugueses com a democracia, atingiu o mínimo histórico de sempre. A maioria dos cidadãos não acredita nesta dita democracia. Por outro lado, é referido, ainda, que se assiste à consolidação de um sentimento anti partidário.
Por outras palavras: a maioria dos portugueses não se revê nos partidos políticos e nas instituições do regime.
Temos aqui, portanto, a «grande obra» produzida pelos partidos políticos desde 1974 para cá: - as responsabilidades e culpas pelo fracasso da democracia, do sistema político/partidário em Portugal, devem-se, exclusivamente, a todos quantos têm feito da política o seu modo de vida, a sua «profissão», e às várias secções partidárias, autênticos feudos – com laços de vassalagem, inclusivamente - de clientelas dóceis e servis aos seus senhores, que almejaram a proeza de produzir em pouco menos de quarenta anos, uma classe de novos-ricos.
Assim, a desilusão e o descrédito para com a democracia que se apoderou da maioria dos portugueses, decorre, maioritariamente, de uma vontade – ou tendência – expressa pelos últimos governos, que tende a alinhar por baixo os valores democráticos conducentes, inclusivamente, à sua eliminação.
Aberta esta autêntica caixa de Pandora, vimos e ouvimos todos os dias nos últimos meses, nos meios de comunicação social, diversas figuras públicas de variados quadrantes socioprofissionais, nomeadamente alguns empresários e intelectuais, fazerem a apologia mais ou menos encoberta da ditadura, porque – dizem – a «democracia está podre» e por razões acumuladas é necessário «mudar o sistema político» nem que seja com «um novo género de ditadura», segundo Joe Berardo.
Quando em 18 de Novembro de 2008 a ex-ministra Manuela Ferreira Leite afirmou que «seria bom haver seis meses sem democracia», para o governo poder implementar as medidas que ela entendia que deviam de ser feitas, mais não expressou em público o que muitos políticos de vários quadrantes diziam – e dizem – em privado. Voltou de novo a fazer semelhante afirmação na semana transata em Coimbra.
Poderia ter acrescentado – dizemos nós – que os governantes que não têm competências nem saberes para governar em regime democrático, em liberdade, só conseguem implementar os seus programas merdosos com repressão, ou seja, em ditadura. 
Infelizmente a senhora Ferreira Leite esqueceu-se de acrescentar que a classe política portuguesa – salvo honrosas exceções – sofre de uma variante da doença das vacas loucas, que resulta da sua falta de bom senso para lidar com a liberdade de expressão, com ideias inovadoras e, sobretudo, com gente mais inteligente e sabedora que eles – que até neles votaram - porque a doença que os acomete após serem eleitos, manifesta-se – sobretudo – na sobranceria, na cagança e no desprezo com que lidam com os seus concidadãos, numa atitude comum aos néscios e imbecis. Eles e elas, é claro. Neste aspecto lembramo-nos de um velho ditado: «Se queres ver um vilão, mete-lhe um pau na mão».
Por tudo isto, quando o leitor chegar ao final da leitura deste texto – que é pequeno – mais umas dezenas de portugueses terão abandonado o país. Fluxo emigratório semelhante ao vivido nos anos sessenta em tempos da ditadura.
Nessa altura - tal como hoje - as causas fundamentais eram a falta de emprego, a miséria e as desigualdades sociais, entre outras.
Estamos em crer que a fuga dos cidadãos nos dias de hoje é, em média, superior à dessa década passada, tanto mais que o facto de Portugal se encontrar – por enquanto – na EU, com fronteiras abertas entre Estados comunitários e haver mais e melhores meios de transporte, facilitadores da saída, torna-se difícil controlar ou saber o verdadeiro número hemorrágico. Neste quadro não incluímos o índice da debandada para o Brasil, Angola, Moçambique e outros países além Atlântico, mais fácil de contabilizar, mas pecando por defeito e não por excesso, uma vez que o visto de «turista» nos passaportes, nem sempre significa que os seus portadores vão de férias.
Acrescidamente lamentável ao facto dos portugueses terem de emigrar para sobreviver, é a qualidade de mão-de-obra qualificada que sai pela porta fora todos os dias. Gente que levou anos a formar-se - e em alguns casos com sacrifícios - muitos deles em universidades públicas, sustentadas pelo erário. Porém, esses cidadãos estão no seu direito de procurarem a sua sobrevivência. O Estado não pode é ter direitos sobre eles.
Esvaído o país de gente jovem, exaurido pelo peso da canga dos impostos, do desemprego, da fome e da miséria, o povo que fica ou se deixa espezinhar pelo poder, ou se revolta, como sempre aconteceu em situações limite de repressão dos governos sobre a Nação, ao longo da sua História.
Entretanto o atual governo, verdadeiro assassino social, continua a sua obra de extermínio da população: os jovens – e menos jovens – compelidos a fugirem do país para sobreviverem, e os idosos que ficam - grande parte deles - a morrerem mais cedo do que seria previsto, à míngua de alimentos suficientes ao seu sustento e/ou por falta de medicamentos receitados para as doenças de que padecem, porque as suas míseras pensões não chegam para aviar as receitas, nem para comerem.
O governo consegue, assim, a proeza de reduzir grande parte da despesa pública recorrendo ao assassinato social.
Mau grado as distâncias cronológicas e as diferenças de contexto, o panorama político, económico e social que se vive hoje em Portugal é semelhante ao dos tempos de estertor da 1ª República, que culminou no golpe militar do dia 28 de maio de 1926 que instaurou uma ditadura militar e, posteriormente, a ditadura salazarenta.
Talvez seja oportuno recordar que nessa altura quase toda a população apoiou a revolução militar, um movimento eivado de equívocos e é nesse sentido que se explica que a ele tenha aderido muita gente de boa-fé, que lenta e gradualmente nos tempos que se seguiram se afastou ou foi afastada desse assalto ao poder.
O golpe militar contou com o apoio das classes dominantes, as chamadas «forças vivas», as classes intermédias, funcionários públicos, empregados de comércio, classe operária: operários industriais e assalariados agrícolas.
No estado caótico em que o país de encontrava, quer económico, quer social – como hoje - era previsível um golpe militar no estilo do ocorrido. A sua amplitude e sucesso contaram com o decisivo contributo e apoio da classe operária e do movimento sindical, vítimas do regime republicano.
Todos estavam de acordo em fazer intervir o exército, onde o nível de vida dos oficiais havia atingido um estado degradante. Aludindo ao brilho dos galões, o povo tinha-os rotulado de «miséria dourada».
O equipamento e o armamento eram obsoletos. Por outro lado, o exército durante anos havia sido preterido a favor da Guarda Nacional Republicana.
Desta forma, a República dissolvia-se por falta do apoio maioritário dos portugueses.
Ouvimos hoje, de novo, amigos e conhecidos a dizerem a medo que, «a minha política é o trabalho», «não quero falar de política», «a política é para os políticos» e conselhos como: «não escrevas nada sobre política em lado nenhum», além de outros mimos medrosos que tais.
Em locais públicos, em cafés, fala-se em surdina com os interlocutores ao mesmo tempo que se vai observando quem está nas mesas em redor, com desconfiança, evita-se falar ao telefone sobretudo no que reporta a política. Dizem-nos que os telefones e telemóveis estão sobre escuta e que há bufos à paisana a escutar o que as pessoas dizem. Temem-se represálias nos empregos, nas escolas, nas universidades. Fala-se em chantagens nos locais de trabalho… .
Como antes do 25 de Abril de 1974, vemos, ouvimos e sentimos o medo e a desconfiança a germinar entre as pessoas.

A DITADURA SEGUE DENTRO DE MOMENTOS


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